O desenvolvimento de produtos é um processo que exige muitas tomadas de decisões importantes para o negócio e que se feitas de forma precipitada ou baseada em premissas erradas podem custar muito caro para a empresa.
NN Group comenta que “as descobertas são cruciais para colocar os projetos de design na direção correta, focando nos problemas essenciais e, consequentemente, construindo a coisa certa.” Quanto mais entendemos as reais dores e necessidades das pessoas, maiores as chances de entregarmos um produto que faça sentido para os usuários e consequentemente para os negócios.
O que é Product discovery?
O Product discovery não é só investigar os usuários, mas também entender a fundo os objetivos de negócio, adaptar métodos, negociar com os envolvidos e avaliar se as decisões a serem tomadas irão trazer os resultados esperados.
É a primeira fase do ciclo de construção de um produto e imprescindível para se validar hipóteses antes de lançar uma nova funcionalidade ou novo produto. Precisamos entender se ele será útil e valioso para usuários e viável tecnicamente para a empresa desenvolver.
A máxima de Steve Blank (super recomendamos a leitura de seus livros sobre Customer Development) está sempre atual e pertinente quando ele instiga todos a “saírem do prédio” (o famoso get out of the building) para encontrar as verdadeiras respostas:
“Nas startups, dentro do escritório não existem fatos, apenas opiniões.”
Teresa Torres, autora do livro Continuous Discovery Habits, defende que as tomadas de decisões no discovery, não devem acontecer apenas nas salas de reuniões com stakeholders de negócio, mas sim que devemos engajar os clientes e usuários na fase de descoberta.
A prática da “pesquisa contínua” sugere ainda envolvê-los desde o início do processo de geração de ideias para o projeto, recebendo o máximo possível de inputs e de forma constante, em reuniões semanais.
No fim de cada ciclo (oportunidade + solução) se compreende de forma clara como o produto/feature resolve (ou não) o problema do usuário e atende as necessidades de negócio mediante a estes experimentos rápidos e de baixo custo. Tem-se assim evidências para determinar se a ideia em questão vale a pena ser considerada e desenvolvida.
Por que é importante?
Os conceitos do Product discovery contribuem para um pensamento mais lógico e sistêmico na tomada de decisões, fugindo do conhecido e frequente feeling ou “sexto sentido” dos empreendedores que muitas vezes se encontram apaixonados por suas ideias.
Utiliza-se técnicas, metodologias e ferramentas para descobrir sinais e indicações que ajudarão na tomada de decisões, questionando suposições e testando hipóteses levantadas pelo time.
Algumas características e ganhos do Product discovery:
- Riscos são assumidos no começo, e não no final: é melhor, mais barato e inteligente arriscar e falhar antes de decidir construir algo do que depois do produto já pronto (em que você muitas vezes já terá investido tempo e recursos em planejamentos, discussões, design, desenvolvimento..)
- Produtos são definidos e projetados colaborativamente: ao invés do modelo “linha de produção”. Fugimos assim do modelo cascata sequenciado, onde produtos são concebidos top-down por líderes que solicitam o que querem que seja feito para os times de produto. Em times fortes, produto, design e engenharia trabalham lado a lado, em uma relação de troca, para levantar soluções.
- Tudo é sobre resolver problemas: não sobre implementar funcionalidades. Produtos convencionais (e até ultrapassados) são baseados em volume de entrega. Bons times estão preocupados não só com a implementação da solução, mas também em garantir que a solução resolva de fato o problema.
Quando fazer um discovery
Pode ser feito em diversas etapas do ciclo de vida de um produto, mesmo após ter sido lançado e estando em funcionamento no mercado (como o lançamento de uma nova feature, por exemplo).
Alguns cenários e motivos onde altamente recomendamos fazer o discovery:
- Quando se conhece pouco a dor que quer resolver
- Tem pouco contato com a realidade e a visão do usuário
- O mercado ainda não tem muitas soluções similares ao que você quer entregar (poucos concorrentes pode indicar pouca validação ou baixo interesse do mercado)
- Está explorando ideias inovadoras e disruptivas
- Quer fazer algo totalmente diferente da solução vigente
- Tem muitos gaps e lacunas de dúvidas sobre como as coisas realmente acontecem na outra ponta
- Não tem o hábito de olhar para indicadores e métricas, roda “às cegas”
E o contraponto, considerando que a prática do discovery inevitavelmente exige um certo esforço da equipe e investimento de tempo, é preciso avaliar se a questão é prioridade para o negócio ou qual o peso de sua relevância e impacto no andamento de seus projetos.
Analise aspectos e se pergunte sobre:
- O valor percebido na oportunidade é alto?
- Qual o nível de risco envolvido?
- Os objetivos em relação ao produto ou mudanças estão claros?
- Quais as vantagens e ganhos potenciais?
- Discovery é mesmo a melhor forma de validar esta ideia?
- Tenho recursos disponíveis (tempo e dinheiro) para executar?
Muitas vezes o timing desse processo de discovery pode não encaixar na correria da empresa, o time pode estar ocupado demais para fazer as coisas de outra forma pela preocupação de manter as entregas em dia. A imagem abaixo traz a ironia do “too busy to improve”, que é mais frequente do que se imagina.
Por isso é realista colocar na balança as perdas versus ganhos potenciais na hora de priorizar o que deve passar por um processo de discovery, com maior ou menor urgência, com maior ou menor intensidade e amplitude.
Idealmente adoraríamos dizer que “tudo” deve ser pesquisado e validado seguindo o processo correto, mas sabemos que na prática existem cenários onde também valem outras abordagens.
Algumas situações onde talvez você opte por “não” realizar o Product discovery:
- Casos onde já se tem bastante repertório sobre o problema e histórico acumulado de contatos com o usuário a ponto de fazer algumas inferências com bom grau de assertividade
- A solução ou feature é muito simples e rápida de ser implementada de maneira que vale a pena testar diretamente “em produção”
- Possibilidade de fazer discovery não usando com pesquisas e investigações diretas com o usuário, mas com abordagens de marketing ou técnicas de validação criativas (concierge, landing page de vendas, anúncio fake door..)
- Alto grau de maturidade do time sobre o problema/solução que geram hipóteses menos arriscadas (“cuidado” com o risco dos pontos cegou e excesso de autoconfiança aqui!)
Product discovery X Product delivery
Product discovery é o trabalho feito para decidir o que construir, e delivery é o trabalho da construção e entrega de fato do produto. Embora ambos os trabalhos sejam essenciais e complementares, nas empresas que não tem uma cultura de UX bem enraizada, o que ocorre é um foco maior em delivery.
Assim, preocupa-se mais em entregar o planejado, construir no tempo e orçamento previstos, deixando o investimento em discovery para segundo plano. Esse costuma ser um erro, já que entregar algo que não atende as necessidades do usuário acaba gerando retrabalho para diversas áreas.
Etapas do Product discovery
Exploração/Alinhamento
Momento onde o time irá explorar um determinado problema ou oportunidade e entender o problema em si para avaliar se faz sentido priorizá-lo. O objetivo do produto foca em mudanças no comportamento e ações do e para o usuário, mas as iniciativas sempre precisam estar associadas a objetivos atrelados a resultados de negócio.
Pesquisa
Ou UX research, é a fase de fazer as entrevistas com usuários, diário de uso continuado, etnografia e etc, antes de ir a campo, para fazer pesquisa, planeje muito! Pense no método que vai usar, por que escolhemos esse ou aquele? Se tiver roteiro, tenha certeza que ele está à “prova de balas” e como vai ser compilado? O que vai fazer em seguida com o resultado das pesquisas?
Ideação
Aqui o time pensa na solução, ou seja, como de fato o produto será criado, alterado ou estendido de tal forma que entregue valor. Em seguida, levanta-se ideias de soluções para cada uma dessas oportunidades e os protótipos e experimentos necessários para avaliar todos os riscos de implementar aquela solução.
Validação e Prototipação
Etapa de tangibilização das ideias geradas anteriormente, ou seja, são feitos protótipos para testar as possíveis soluções e hipóteses. Técnicas como entrevistas para validação, grupos focais ou testes de usabilidade são utilizados para entender se o que foi visualizado de fato resolve a dor dos usuários de maneira efetiva.
Refinamentos
Após a prototipagem, é definido o que será entregue no MVP, ou mínimo produto viável, para oferecer uma primeira versão do produto com os recursos essenciais para o seu funcionamento, visando conhecer a reação do mercado.
Continuous discovery
O princípio aqui é que, se houver problemas, quanto antes encontrar, melhor, e o produto deve ser testado e validado, com pequenas entregas em todas as suas etapas. Ou seja, o UX design deve estar presente em todo o ciclo de vida do produto. Você pode utilizar para isso, o modelo de continuous discovery, partindo da árvore de oportunidades, criado por Teresa Torres:
- O primeiro passo é definir o objetivo do negócio, nessa etapa se faz o levantamento e as buscas por oportunidades
- Depois vem o espaço das oportunidades, pesquisa sobre dores, necessidades e desejos dos usuários, as “oportunidades”, que depois de identificadas, podem ser comparadas, priorizadas e trabalhadas de forma “ágil”
- E por fim o espaço de soluções, onde as oportunidades mapeadas são testadas e validadas para avaliar se a solução faz sentido.
Realizar Product discovery é uma maneira consistente de entender quais oportunidades de negócios parecem mais interessantes de serem exploradas a partir de estudos que analisam mais de uma perspectiva (não só o usuário mas também o mercado, a concorrência, as tendências tecnológicas). Dessa forma, permite-se que os produtos e novas funcionalidades sejam mais alinhados ao negócio e mais assertivos as necessidades e dores dos usuários (contribuindo para o Growth UX), o que torna a chance de sucesso maior e consequentemente o ROI (retorno sobre o investimento) mais alto.
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